terça-feira, 11 de novembro de 2014

Cegos


Olá, velho amigo
quase não te reconheço
o que tens feito da vida?
pareces-me cansado
e eu... envelhecida,
sem o brilho de outrora

nossas faces demarcadas
por vitórias e derrotas
entalhadas pelos ventos
dos tortuosos caminhos
que separadamente
escolhemos percorrer

talvez te desagrades
do que vês em mim
mas o que percebo em ti
é que a vida te poupou
das várias cicatrizes
que me foram destinadas

o nosso conto de fadas
há muito encerrou-se
numa gaveta qualquer
mas se desejares,
relê alguns capítulos
e ignora deles o final

a memória já escassa
meu olhar engana
turva-me a lembrança
e não recordo o que vivi
pergunto-me quem és
e se algum dia te conheci

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Saudade

Foto: Imagem do Google, desconheço a autoria.

Completam-se hoje 9 dias
rumo ao nunca mais.

De modo tão doloroso
arrebentaram-se os nós.

Sigo sozinha.

Não posso mais abraçar-te
nem ouvir tua voz.

Agora é tudo memória.

O pó voltou ao pó.
O vento levou as pegadas...

Nada restou por aqui.
A morte arrancou-te de mim.

Procuro-te em moradas
antigas e novas...
Bato às portas, chamo,
mas não vens...

Não estás mais.

Onde dormes, mãe?

Em meu pensamento, rogo-te: 
Não te esqueças de mim.
Espera-me em teu novo lar;
prepara-me um aposento,
para quando eu chegar...

Com amor, tua filha.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Ajuda

Foto: Imagem do Google, desconheço a autoria.

Era ainda uma criança, 
em frente à porta trancada do quarto de minha mãe
braços pendentes, ombros arqueados, ouvidos atentos
à espera de qualquer ruído 

Da porta para dentro tudo era silêncio
apenas minha mãe e a raiva
Da porta pra fora somente desespero
e a única certeza de que o erro era meu

Naquela altura eu não imaginava
que essa seria somente a primeira porta
de tantas outras que me seriam fechadas

Tinha pavor do silêncio do lado de dentro
e da solidão do lado de fora

O silêncio podia significar a morte
a morte que minha mãe anunciava
ao trancar-se naquela prisão

Muito mais tarde entendi que a prisão
poderia estar em qualquer dos lados
tanto fazia... ela é o lado que pune
e separa os que erram dos que não perdoam

As fábulas nos dizem que palavras abrem portas
então repeti milhares de vezes: "me perdoa", "eu te amo" 
e, por fim,"Senhor, me ajuda"...

A criança cresceu, porém a cena se repete:
uma porta trancada, duas mulheres e duas prisões.
Do lado de fora estou eu: braços pendentes, 
ombros arqueados e ouvidos atentos
 à espera de qualquer ruído.

quarta-feira, 30 de julho de 2014

Coisas que não te contei...

Foto: Imagem do Google, desconheço a autoria.

Para proteger-te
estendo os braços, cerro os punhos
posto-me à tua frente
e não consinto que te abatam

Para cuidar de ti
adormeço antigas dores
amordaço gritos teimosos 
e não permito que enfraqueças

Para te ver sorrir
escondo as incertezas
silencio sonhos particulares 
e não te abandono às tempestades  

Para que progridas
ensino-te a ser livre
encorajo-te a ser forte
e não te prendo aos meus passos

Para que cresças e vivas
faço-me esquecida, faço-me sozinha
preparo meu melhor aceno
e não te revelo o mar no meu peito

Para que sejas feliz
falo que nada quero ou preciso
visto-me de frescor e primavera
e não confesso que te poupo de mim.

domingo, 4 de maio de 2014

Audrey

Fonte: Imagens do Google

Nem diz o que pensa 
a boneca miúda
tão frágil, tão bela
de olhos cerrados

Também, não precisa
pois tanto primor 
dispensa bramido
e desperta o silêncio

Brinquedo de vidro 
com arte entalhado
desenho perfeito
de harmonia e leveza

Mocinha bonita
teu rosto tranquilo
enfeita, fascina
te adoro, menina...

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Porvir

Foto: Imagem do Google, desconheço a autoria.


Adeus a tudo que fiz
adeus promessas 
adeus passos apressados
adeus fins de tarde
adeus música ao longe

quero estar onde nada há

adeus ao que não esqueço
adeus ao que não tive
adeus abraços doloridos
adeus sorrisos escondidos
adeus olhares curiosos

quero estar onde nada há

adeus estrelas cadentes
adeus instantes eternos
adeus resistências
adeus desespero
adeus ao que deixei ficar

quero estar onde nada há
quero o mistério
quero a luz 
de um tempo que ainda virá.

sábado, 5 de abril de 2014

Ostra

Foto: Imagem do Google, desconheço a autoria.

Tenho evitado as pessoas
me afastado de casas, de ruas
de lugares onde sou reconhecida
tenho me escondido de espelhos
de fotografias
tenho me retirado do tempo
sufocado memórias
vestido-me de sombras
coberto-me de anonimato
ocultado-me de tudo

porque o compartilhar me cansa
o conviver me exaure

são poucas as vozes que me acalmam
são raros os sorrisos que me alegram
e são poucos os braços que me salvam

sábado, 29 de março de 2014

Descompasso


Foto: Imagem do Google, desconheço a autoria.

Caminhamos tanto
durante muito tempo
e não sabemos bem
onde chegamos

Nas passadas rápidas
nos esquecemos
quem somos
e o que queremos

Nossas mãos se desataram
o cansaço nos guiou
e agora, não há palavras
nós dois: nenhuma frase

Deito-me em teu colo

teu olhar distante
... no ontem
meu olhar distante
... no amanhã

Acaricias meu rosto
... eu choro