Foto: Desconheço a autoria. Obtida na página @Whitephotosblack
É preciso esquecer
a menina do passado
e olhar para a mulher
que mora ao lado
é sobre ela que cai a chuva
é ela que acena e clama
é dela o grito que assusta
e o distante pedido de ajuda
caminha descalça, agora
a que outrora usou saltos
não são retas suas pegadas
nem levam a lugar algum
seu curto e instável pisar
só quebra o silêncio
pelo riscar da vertigem
tateada nas paredes da vida
não tem sonhos, não tem nada
a coitada bem pouco espera
portanto, se alguém a vir
fale um pouco com ela
seus amigos se foram
partiram seu pai e sua mãe
não lhe sobraram sequer paixões
apenas o que se chama de medo
a mulher ao lado
faz tempo não se (re)conhece
não recebe abraço ou carinho
suas lágrimas secaram
a mulher ao lado
aos poucos envelhece
não encanta a mais ninguém
não engana o seu riso forçado
e pessoa nenhuma se interessa
pelas opiniões e verdades
daquela mulher
que não traz novidades
a mulher ao lado
não coleciona, não soma
nada mais nasce dela...
está vestida de ausência
ela deixou-se ir sumindo
a começar pela pessoa
que se via pelos espelhos
e hoje é foto no fundo do armário
a mulher ao lado
não tem mais histórias
o acervo de seu ignorado museu
deteriorou-se junto com ela
portanto, se alguém a vir
diga-lhe que pode voar
pois ela nunca usou suas asas
mas agora necessita partir