terça-feira, 5 de dezembro de 2017

Solitaire

Foto: A man on the road, por Guasor

Na curva da estrada
me encontro sozinho
andei tanto e não vi
o que ficou no caminho
sem um aceno
sem um adeus

Voltar não consigo
ir adiante não quero
desconheço a jornada
e não tenho destino
sem tua mão
sem tua voz

Sozinho eu temo
e tremo de frio
onde foi que perdi
a melhor parte de mim?
sem chance
sem tempo

Desisto, enfim.

segunda-feira, 19 de junho de 2017

Seol


Sombras espalham-se nos muros,
arrasto-me pelas ruas.
Sou o que se esgueira,
sou o que espreita
dos becos, dos bueiros, das esquinas...
não faço alarde, ando sorrateiro
aguardo os que vagam pela noite
e retiro-lhes as esperanças.
Ouço seus gritos inúteis, 
pois desconheço a compaixão.
Apresento-me a eles, então...
sou o olhar do assassino
refletido no brilho da lâmina,
sou o lamento das vítimas
banhado no sangue e no medo.
Todo o mal, toda a feiura
que molda os seus pesadelos
conseguirão encontrar em mim.
Sou o senhor da violência,
o mestre do submundo
onde os insanos e os perdidos 
me encontrarão um dia,
no caos cinzento e profundo
semeando vícios e guerras
coberto de lama e pecados.

sábado, 18 de fevereiro de 2017

Meus rios



Foto: Rio Negro, por Ray Baniwa

Naquela noite havia lua.
Minha alma pediu-me: vai! 
A saudade gritou-me: parte! 
Cansada, estendi os braços,
senti o vento a me embalar.
Busquei o firmamento,
vi um céu sereno,
salpicado de estrelas.

Eu, que havia estado 
no fim do mundo
e não encontrara alento...
Por muitas e longas noites
chorara pedaços da minha vida
até transformá-la, 
minuto a minuto,
num imenso rio de saudade.

E as águas profundas
que brotaram de mim,
revelaram-me cidades e aldeias
tais quais os rios de minha terra...
Nascentes que geram vidas,
ouvem lamentos de mulheres,
guardam segredos de guerreiros
e acalmam a sede de animais.

Rios escuros, solitários,
jazigo de náufragos...
Rios sagrados, antigos,
templos dos deuses da floresta.
De dia, cálidos e serenos
banham crianças, 
lavam roupas, conduzem barcos,
misturam lendas a esperanças...
Queridos rios da minha terra.

De noite, misteriosos,
carregam monstros adormecidos.
São assim aqueles rios
de águas mornas e ferozes.
Quero misturar minha vida
aos rios da minha terra,
partir com eles para longe
sabendo que jamais voltarão.