sábado, 4 de fevereiro de 2012

Ophelia


Benditas águas, que a tudo purificam, levem para longe o que possa ter restado de mim. Águas serenas transformem em bênçãos os dias que virão.

Que todas as tuas gotas possam tornar-se ondas silenciosas, cessando os turbilhões que outrora ameaçavam arrebatar minha terra firme.

Águas claras diluam, dissipem toda a dor, escorram as minhas memórias em fortes tempestades.

Conservem parada a superfície do lago em que me transformei, agora gelado e vazio. Permitam que todas as histórias depositem-se no leito mais turvo e profundo, na parte inóspita do meu mundo.

Águas tranquilas, sejam as únicas testemunhas do sepulcro que minha vida abraçou. Levem com as correntezas os pedaços arrancados do meu peito, as gotas que me ardem nos olhos, o sangue que me amarga a boca e me queima as veias.



Afoguem meu corpo cansado, misturem minha matéria ao sal dos tempos e me envolvam de lírios os cabelos, que agora deixo soltos, misturados às tuas espumas.


Que apenas minha alma flutue, conduzida pelas tuas marés, evaporando-se, por fim, nas nuvens alaranjadas do teu por-do-sol.