segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Feliz Ano Novo


Foto: Imagem do Google, desconheço a autoria.


O normal seria vestir branco
Seria beber champagne
E soltar fogos na varanda
Também seria normal
Comer lentilhas
Fazer simpatias, ter esperanças
Pular sete ondas
Escrever planos na agenda

Mas isso seria o normal
E eu não quero
nada assim

Quero o anormal
O inesperado
O meu próprio tsunami...


quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Solitude


Foto: Acervo Getty Images.


Não a procurem em velhos álbuns de fotografias.
Depois de tanto tempo, descobriu que não cabia nem no seu nome.
Fugiu de sua cidade para encontrar amigos. Fugiu de sua antiga religião para encontrar Deus.
Mudou de endereço e levou apenas lembranças.
Saiu de férias pra outros lugares. Ganhou mundo.
Quebrou suas cercas. A sensata virou louca.
A menina das fotografias virou a mulher que, em divãs, falou a estranhos sobre si mesma. E foi com estranhos que descobriu quem era e o que queria.
Não a procurem nas canções que um dia amou.
Outros sons a conquistaram e hoje ela nem lembra dos acordes da juventude.
Não a procurem nas bibliotecas que freqüentou. Acabou preferindo viver outras vidas projetadas em telas de cinemas.
Mas não a encontrarão mais nos cinemas, nem por trás dos enormes sacos de pipocas, com as mãos umedecidas por lágrimas silenciosas.
Àqueles que ainda tiverem cartas por ela escritas: Saibam que ali somente os fatos permanecem coerentes, relatos de alguém que já não pertence àquelas letras.
Busquem-na (sim!) nas poesias de Neruda, versos de palavras nobres e atemporais.
Ela sempre estará ali, em meio àqueles poemas, sentada aos pés dos trigais em flor, respirando todo aquele amor que não era dirigido a ela, mas a uma outra Matilde.
Ela se perdeu em seu labirinto, onde ninguém entra, o tempo não existe, onde os sonhos não passam do dia de amanhã.
Num dos corredores escuros pendurou apenas dois retratos, dois rostos amados. Sei que olha para eles todos os dias, já que não tem janelas e seus olhos escuros não enxergam paisagens.
Ela ainda se recorda do que foi, do que esperou, do que amou.
Porém, abandonou-se, abortou-se e pagou o preço: Morreu pela metade, para descobrir que após a morte ainda continuava existindo através das pílulas.
Não é um problema, mas uma libertação: Rasgam-se os mapas, as regras, os contratos e a própria carne vai junto.
Hoje se embriaga, se afoga em si, pobre criatura de passos curtos. Dá vexame e ninguém vê.
No hay banda.
Provavelmente ali não haja mais nada.
Apenas ela e seu subsolo. Solitude. O último degrau da dor.
Mas os exames de sangue dizem que ela está bem.